Remexendo nuns arquivos antigos, encontrei um conjunto de textos que escrevi há alguns muitos anos atrás. Parece que a gente cresce, vira adulto, assume mil compromissos, e os sentimentos se repetem. Hoje eu estou igual a Lili.
"Quarto Episódio: Insônia
Lili não consegue dormir. Rola de um lado para o outro e não prega os olhos. Até que tenta fechá-los, mas a força da insônia é maior. “Tudo bem, vou tentar. Respirar fundo, calma, fechar os olhos bem devagar...” O problema é o medo do quarto escuro. Não o quarto de fora, mas o quarto que existe dentro da Lili.Toda vez que ela não consegue dormir é por causa do quarto escuro: o porão da sua alma. Um porão, onde ficam aqueles quadros antigos, aqueles móveis comidos pelos cupins, baús cheios de segredos, lâmpadas queimadas, mangueiras enroladas há anos, chaves de todas as portas do mundo, abajoures quebrados. Tudo isso coberto por uma grossa camada de poeira e sombra. Nestas horas de insônia, ela entra dentro desse quarto escuro e fica lá, quietinha, sentada sobre o lençol amarelado que cobre uma enorme poltrona velha e macia. Os pés não encostam no chão e ela não enxerga um palmo a frente. A escuridão dá um pouco de medo no início, mas depois é boa, segura, forte e é lá que moram todos os medos, as inseguranças. Todos os fantasmas."